Habitante raro das profundezas é doado à Coleção de Peixes do NUPEM/UFRJ

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No dia 28 de agosto, o Sr. José Maria Vieira Rodrigues, morador do Bairro Ogiva em Cabo Frio, estava indo trabalhar quando ouviu o som de algo se debatendo na água, em um canal próximo à sua casa. “Achei que era um cachorro se afogando e fui lá ver para tentar salvar o bicho”, disse o Sr. José Maria. Qual foi sua surpresa ao ver um peixe comprido, “cabeçudo” e prateado que nunca tinha visto na vida, preso às margens do pequeno canal!

Assim começava a história de uma descoberta fascinante, do encontro de um dos peixes marinhos mais raros do mundo.

Segundo o Sr. José Maria, o peixe já estava bastante fraco e morreu logo depois de ser retirado da água. Intrigados e com uma imensa vontade de descobrir o que era o tal bicho estranho, a esposa do Sr. José, a Sra. Marcia de Jesus Pinheiro, ajudada por sua sobrinha Vanessa Veiga, tiraram algumas fotos e fizeram um vídeo do estranho peixe. Essas imagens foram encaminhadas a alguns grupos de Whatsapp voltados ao meio ambiente do qual fazem parte por interesse no assunto. “Também enviamos as fotos para diversos locais que pesquisam peixes, de Cabo Frio, Arraial, e do Brasil todo. Em uma dessas conversas, me recomendaram que a gente entrasse em contato com os pesquisadores do NUPEM/UFRJ, em Macaé”. E foi assim que o raro exemplar de Lophotus acabou sendo incorporado à Coleção de Peixes do NUPEM/UFRJ.

Sr. José Maria logo após o resgate do exemplar de Lophotus (foto: Vanessa Veiga).

A Coleção de Peixes do NUPEM/UFRJ é uma das principais Coleções científicas voltadas para o estudo dos peixes marinhos do Brasil. O acervo da Coleção atualmente possui cerca de 7.000 lotes, contendo milhares de exemplares de peixes, principalmente da Bacia de Campos, mas também de outras partes do Brasil e do mundo. As pesquisas feitas a partir da Coleção de Peixes são reconhecidas internacionalmente e servem de base para o incremento no conhecimento das mais diversas áreas, como diversidade, ecologia, evolução e conservação. Diversos estudantes de graduação e pós-graduação do NUPEM/UFRJ e de outras partes do Brasil também utilizam o acervo da Coleção para suas pesquisas.

Local onde o estranho peixe foi encontrado, em Cabo Frio

Quando o Prof. do NUPEM/UFRJ Fabio Di Dario, que é um dos curadores da Coleção de Peixes, viu as fotos enviadas pela Sra. Marcia em seu e-mail, ele quase não acreditou. “Levou uns cinco minutos para eu me convencer de que aquele peixe magnífico era um exemplar do gênero Lophotus, um dos peixes marinhos mais raros do mundo”. A emoção da descoberta foi compartilhada com o Prof. Michael Mincarone, outro curador da Coleção de Peixes do NUPEM/UFRJ. “Existem poucos exemplares de Lophotus depositados em Coleções. No Brasil, devem existir uns três ou quatro, apenas”.

O gênero Lophotus faz parte da família Lophotidae, ordem Lampriformes. Os peixes dessa família são habitantes de mar aberto e tipicamente ocorrem em grandes profundidades. Não se sabe muito bem por que, mas eventualmente alguns exemplares aparecem nas praias, geralmente mortos ou moribundos. Encontrar esse peixe raríssimo em um canal dentro da cidade de Cabo Frio é algo totalmente inesperado.

O exemplar de Lophotus em vista lateral (foto: Vanessa Veiga)

As espécies de Lophotus são tão pouco conhecidas no Brasil que sequer possuem nome popular. Segundo a Sra. Marcia, “quando viram as fotos, alguns pescadores aqui da região me disseram que podia ser um peixe-espada com alguma deformidade na cabeça!”. Na verdade, não há nenhuma deformidade aparente no exemplar encontrado pelo Sr. José Maria: esses peixes realmente são estranhos, possuindo um focinho curto e uma espécie de protuberância no topo de suas cabeças. Os peixes-espada, comumente pescados e encontrados na região, são mais compridos, brilhantes e de focinho afilado, e fazem parte de um grupo totalmente distinto de animais, no gênero Trichiurus (família Trichiuridae).

Clique aqui para ver o vídeo do exemplar de Lophotus, logo após seu resgate, feito por Vanessa Veiga.

Também devido a essa raridade, ainda não se sabe exatamente quantas espécies de Lophotus ocorrem no Brasil. E nesse sentido, conforme consta no Certificado de Recebimento de Doação entregue com muita alegria ao simpático casal que foi responsável por essa brilhante descoberta, “graças ao empenho e carinho da Sra. Marcia e do Sr. José Maria, esse exemplar raro de peixe será utilizado em diversos estudos pelas gerações futuras de biólogos e biólogas do Brasil e do exterior, engrandecendo enormemente nosso conhecimento sobre os mistérios do oceano profundo”.

Sra. Marcia de Jesus Pinheiro e Sr. José Maria Vieira Rodrigues, com o Certificado de Recebimento de Doação, acompanhado pelos Profs. Michael Mincarone (esquerda) e Fabio Di Dario (centro), Curadores da Coleção de Peixes do NUPEM/UFRJ.

Muito obrigado, Sra. Marcia e Sr. José Maria! Que a curiosidade e interesse de vocês pela descoberta científica e pelo meio ambiente continuem inspirando e transformando todos ao redor.

As pesquisas desenvolvidas na Coleção de Peixes do Instituto NUPEM/UFRJ são apoiadas por diversos projetos, entre eles o Projeto MULTIPESCA (FUNBIO, Processo 104/2016) “Pesquisa Marinha e Pesqueira”, o Projeto PROTAX/CNPq (443302/2020) “Biodiversidade de peixes criptobentônicos e do oceano profundo do Brasil: a consolidação de um Centro de Pesquisa em sistemática de táxons negligenciados de peixes marinhos”, e o Projeto FAPERJ (FAPERJ E-26/210.290/2021) “Museu da Biodiversidade do Norte Fluminense: construindo e difundindo ciência no interior do estado do Rio de Janeiro.”