EXPLICAÇÕES SOBRE O ENCALHE DE GOLFINHOS RAROS CONFUNDIDOS COM TUBARÕES

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Kogia breviceps (cachalote-pigmeu), crédito: Sergio Martínez (Licenciado sob http://creativecommons.org/licenses/by-nc/4.0/)

Um vídeo tem circulado nas redes sociais e está causando alvoroço de turistas e moradores na região dos Lagos e Norte Fluminense. No último dia do ano, um evento raro aconteceu na Prainha, Arraial do Cabo/RJ. As imagens mostram uma mancha marrom avermelhada na água e alguns animais de grande porte se debatendo, chegando a encalhar na praia. Como de costume para a véspera de feriado de Ano Novo, a praia estava lotada de banhistas que, ao notarem o episódio, rapidamente saíram da água. Houve um tumulto generalizado e logo a notícia de que um tubarão estava atacando uma presa se espalhou. Passado algum tempo, especialistas puderam avaliar melhor a situação.
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Trata-se de um evento raro de encalhes de golfinhos (cetáceos com dentes – Odontoceti) do gênero Kogia. Existem duas espécies de Kogia no mundo, o cachalote-anão Kogia sima e o cachalote-pigmeu Kogia breviceps, e ambas também ocorrem no Brasil. São animais pouco estudados e de hábitos oceânicos, daí a raridade do evento.

As kogias têm algumas características muito particulares, o que as tornam ainda mais fascinantes. Possuem o “rostro” (focinho) similar ao de um tubarão, com dentes pontiagudos e uma pigmentação na lateral da cabeça que lembra as fendas branquiais. Além disso, são os únicos cetáceos com uma glândula de pigmento marrom avermelhado, localizada no intestino e próxima ao ânus. Quando ameaçadas, ejetam esse jato de “tinta” para confundir o predador, semelhante aos polvos.

Modificado de McAlpine (2017), fonte: https://doi.org/10.1016/B978-0-12-804327-1.00209-0

Segundo a especialista do Nupem, Bruna Pagliani, “saber a espécie com exatidão requer uma análise mais precisa. Com os vídeos disponíveis até o momento, não se pode afirmar a espécie ao certo. Os dois exemplares são bem parecidos e são necessários detalhes das características do corpo, como: posição e tamanho da nadadeira dorsal, tamanho corpóreo e formato da cabeça”. Algumas pessoas reconheceram que se tratavam de “baleias”, e não tubarões, e conseguiram devolver os três indivíduos de volta ao mar com sucesso.

Os impactos antrópicos a que esses animais estão sujeitos são inúmeros e em um evento raro de encalhe como esse fica ainda mais difícil saber a causa. Um artigo publicado em 2016 (Moura et al. 2016), que revisou os encalhes de Kogia ao longo do litoral brasileiro, sugere que a velocidade do vento parece contribuir de forma relevante para encalhes. No litoral norte fluminense, há uma grande influência da ressurgência costeira, principalmente no período de verão, quando há uma predominância dos ventos nordeste e, consequentemente, ocasionando um aumento da produtividade das águas.

Bruna também acha importante ressaltar que “em eventos de encalhe, os animais chegam às praias debilitados ou sob alguma fonte de estresse. Existe ainda a possibilidade desses indivíduos voltarem a encalhar infelizmente… Vamos acompanhar e torcer para que essas kogias continuem seu rumo de volta ao mar aberto”!